A PAIXÃO PELOS
LIVROS
SEGUNDO
LEITORES MUITO ESPECIAIS
Edições Sesc
São Paulo lançam
uma coletânea
de ensaios sobre o prazer da leitura
“Somos
fascinados por aqueles que sabem contar histórias. Por certo, reconhecemos sua
capacidade inventiva, espécie de dom sobrenatural, capaz de dar forma,
densidade e conteúdo aos sinais invisíveis daquilo que não ousamos imaginar.
Capaz de dar sentido às escolhas e ordenar as incertezas vinculadas ao destino.
Capaz de extrair poesia do improvável, como Mario Quintana, ao sugerir que “a
mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer”
Danilo Santos
de Miranda
Diretor
regional do Sesc São Paulo
Entre
2008 e 2010, o Sesc São Paulo organizou o ciclo de debates Tertúlia, no
qual mais de 40 escritores e tradutores foram convidados a falar de uma obra
literária especial com cujo autor eles mantivessem uma relação particular de fascínio
e admiração. Com curadoria do escritor Tiago Novaes, o projeto constituiu uma
bem-sucedida iniciativa de aproximar o grande público não somente de autores
consagrados, vindos de um passado distante, ou mesmo ainda em atuação, como
também de excelentes escritores e tradutores contemporâneos em franca atividade
de criação.
Cinco
anos depois da estreia do ciclo, as Edições Sesc São Paulo lançam Tertúlia:
o autor como leitor, que reúne 21 daqueles encontros, concebidos agora sob
a forma de ensaios literários nos quais incide uma ótica bastante singular.
Trata-se de um livro que, sem abrir mão do rigor e da sofisticação intelectual,
dirige-se a um só tempo a dois tipos de público: o leitor iniciado – que
certamente colherá nos ensaios informações e reflexões bastante apuradas sobre
determinadas obras e autores – e o leitor novato, para o qual os textos dessa Tertúlia
poderão funcionar como uma espécie de guia de leitura, orientando gostos,
estimulando a capacidade crítica, propondo repertórios mínimos de leitura...
A
palavra tertúlia implica a noção de três significados complementares: o
primeiro deles diz respeito à ideia de uma reunião de parentes ou amigos; o
segundo, de uma palestra sobre literatura; e o terceiro, de uma pequena
agremiação literária. Sem deixar de lado, naturalmente, tais sentidos, cada um
dos ensaístas convidados procurou ampliar a significação da palavra para um
aspecto implícito em sua própria etimologia: tertúlia também diz respeito a uma
reunião de pessoas que, divertidamente, discutem, jogam ou conversam.
O
debate, jogo ou bate-papo que cada epígono, aqui, estabelece com seu mestre não
poderia ser mais estimulante para o leitor. Sérgio Molina trata de Miguel de Cervantes;
Maria Esther Maciel, de Jorge Luis Borges; Marcelino Freire, de Manuel
Bandeira; Lygia Fagundes Telles, de Machado de Assis; Leonardo Fróes, de
Virgínia Woolf; Juliano Garcia Pessanha, de Franz Kafka; Eric Nepomuceno, de
Gabriel García Márquez; Julián Fucks, de James Joyce; Márcio Souza, de Inglês
de Souza; Boris Schnaiderman, de Lev Tolstói; Manuel da Costa Pinto, de Albert
Camus; Ana Miranda, de Augusto dos Anjos; Cláudio Willer, de Hilda Hilst;
Bernardo Ajzenberg, de Philip Roth; ContardoCalligaris, de Luiz Alfredo
Garcia-Roza; Paulo Bezerra, de FiódorDostoiévski; Rodrigo Lacerda, de João
Antonio; Nélida Piñon, de Juan Rulfo; Luiz Rufatto, de Guimarães Rosa; Mamede
Jarouche, da literatura árabe (em especial, do Livro das mil e uma noites);
e, por fim, o próprio organizador da coletânea, Tiago Novaes, trata de Moacyr
Scliar que, por sua vez, havia falado de Kafka em uma tertúlia, antes de
falecer.
Cada
um dos homens de letras convidados a falar sobre seus livros de cabeceira e
sobre seus autores prediletos teve ampla liberdade na abordagem de seu objeto
de culto, resultando o livro em uma coletânea que prima por uma bem-vinda
originalidade temática, metodológica e formal. A escritora Lygia Fagundes
Telles (que forma com o tradutor Boris Schnaiderman o casal de decanos no
espesso elenco de ensaístas), por exemplo, conta em um texto tão breve quanto
saboroso, tecido pela mais épica das faculdades, a memória, sua relação íntima
e pessoal com Dom Casmurro, que acabou lhe rendendo um belo fruto
profissional: “Algum tempo depois, quando Paulo Emílio Salles Gomes e eu
morávamos na Rua Sabará, eis que o cineasta Paulo César Saraceni nos visitou,
pretendia dirigir um filme baseado no romance Dom Casmurro e queria que
o roteiro fosse nosso. (...) Começamos a trabalhar com paixão, às vezes
varávamos a madrugada, o bule de café, o cinzeiro atochado de tocos, o livro
aberto na mesa... Ainda impregnada da última leitura, instintivamente eu tomava
o partido de Bentinho, embora soubéssemos que não devíamos revelar a nossa
opinião. Na dúvida, suspender o juízo! ‘Nisso está a força do nosso trabalho’,
dizia o Paulo Emílio. Até que certa manhã, repentinamente, ele me encarou,
apreensivo, ‘Meu Deus, você está ficando com a cara do Bentinho!’. Respondi
rápida, ‘Então é porque você está me traindo!’”.
Eric
Nepomuceno, autodeclarado um “escritor que traduz” (graças a sua paixão pela
literatura latino-americana, o leitor brasileiro há um bom tempo tem à
disposição algumas das obras essenciais de Julio Cortázar, Eduardo Galeano e
Juan Carlos Onetti), defende empenhadamente uma poética da tradução, tomando Viver
para contar, de Gabriel García Márquez, como parâmetro: “Há expressões
belíssimas, ao longo de todo o livro, de uma estrutura difícil, como se fosse
uma sinfonia de câmara. Manter essa construção exigiu muito esforço e muita
atenção. O texto é de uma delicadeza, de uma sutileza, que representaram um
perigo permanente. As imagens, sempre tão pessoais em García Márquez, se
renovaram nessa escrita”.
Julián
Fuks, o mais jovem dos autores da coletânea, vai ao encontro de um dos
testemunhos literários mais convulsivos do século – Ulisses, de James
Joyce –, munido de uma sinceridade radical temperada por discreta dose de
sabedoria: “Alguém há de perguntar o que um jovem brasileiro, distanciado por
quase um século e um oceano inteiro desse sujeito tão peculiar e tão complexo
que foi James Joyce, teria a dizer sobre sua obra. A pergunta é pertinente e
encontra resposta fácil se um de seus pressupostos subjacentes for a exigência de
informações novas, de afirmações novas. O que tenho a dizer de novo sobre James
Joyce? Absolutamente nada. Mas antes que os leitores fechem este livro com a
dose de indignação que lhes pareça adequada, cabe ressaltar que essa
impossibilidade incontornável já havia sido devidamente avisada. Se o dia
remoto em que se passa Ulisses, o dia 16 de junho de 1904 ao qual farei
alusão nestas próximas páginas, guardava em si toda a eternidade, nada de novo
pode restar para além de suas limitadas horas. Passado e futuro se condensaram
naquele retrato tão minucioso da humanidade, e num panorama tão extenso como
esse não poderiam faltar jovenzinhos pretensiosos com vãs esperanças de saber
um átimo – ou de falar algo interessante – sobre a vida, sobre a literatura, sobre
a arte”.
Inúmeras
são as possibilidades de fruição de Tertúlia: o autor como leitor, com o
qual as Edições Sesc São Paulo anunciam sua bem-vinda entrada na esfera da
crítica literária, fazendo uso da mesma inventividade que marca a atuação da
instituição na área da ação cultural, vocacionada sempre para os projetos
transdisciplinares de educação não formal. O leitor não encontrará nas páginas
da obra aquela erudição tortuosa ou o hermetismo vaidoso que costumam rondar
boa parte da crítica literária produzida nos círculos universitários e
acadêmicos. De modo bem menos convencional, o livro pretende difundir
informação de qualidade e estimular o debate mais consequente, objetivando
também, é claro, aumentar o público leitor de língua portuguesa em torno desses
autores e dessas obras.
Por
isso o nome da coletânea não poderia soar mais apropriado, já que ela,
despretensiosamente, pretende chamar o leitor para o centro de uma conversa
animada a respeito da cultura letrada. Os ensaios de Tertúlia convidam
todo amante da leitura a adentrar o vasto universo da literatura e a sair dele
mais bem preparado para refletir sobre a realidade que o cerca. Afinal, como
Alberto Manguel, ele também um especialista nas possibilidades da leitura,
afirma: “Somos animais narrativos, viemos ao mundo acreditando que ele é um
livro que nos conta histórias”.
FICHA
TÉCNICA:
Editora: Edições Sesc São Paulo
ISBN: 978-85-7995-073-5
ISBN: 978-85-7995-073-5
Páginas: 424 p.
Preço: R$49,00
Lançamento: Dia 12 de dezembro, às 20h, no Sesc Pinheiros – Rua
Paes Leme, 195
Na ocasião haverá
encontro do organizador Tiago Novaes com
os autores Luiz Ruffato
e Marcelino Freire
SOBRE O ORGANIZADOR
Tiago Novaes nasceu em 1979 na cidade de
Avaré, São Paulo. É escritor, tradutor e doutorando em Psicologia na USP.
Publicou “Subitamente: Agora” (7 Letras), “Estado Vegetativo” (Callis) e
“Documentário” (Funarte). Dirigiu o longametragem “Herança” e integra a
antologia “15 CuentosBrasileros” (Comunicarte), editada na Argentina. Recebeu
bolsas de criação literária da Secretaria de Cultura de São Paulo e da Funarte.
Foi finalista do prêmio São Paulo de Literatura, em 2008. Idealizou e produziu
os ciclos Tertúlia: Encontros da Literatura em unidades do Sesc São Paulo,
coordenou oficinas de prosa no Sesc São Paulo, na Academia Internacional de
Cinema e no projeto Tantas Letras!. Traduziu, ainda, mais de dez obras de
ficção e não-ficção para diferentes casas editoriais.
SOBRE AS
EDIÇÕES SESC SÃO PAULO
Segmento
editorial do Sesc, as publicações das Edições Sesc São Paulo são pensadas e
construídas em um longo processo de maturação e discussão, justamente por
estarem envolvidas em projetos de largo alcance. As Edições Sesc SP têm em seu
catálogo publicações nas áreas de cultura, artes, esportes, ciências sociais,
educação, filosofia, terceira idade e história. Muitos desses trabalhos
articulam-se em diversas mídias, para atender aos anseios de um público
interessado em informações plurais, que podem vir de diferentes recursos
multimídia, integrando texto, áudio e vídeo. Seu projeto gráfico, muitas vezes
arrojado e experimental, constitui-se também em um campo para a criação.
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