Com 256 prefeituras eleitas nesse último pleito, o PT sofreu, de fato, uma derrota expressiva e encolhimento no número de cidades administradas, retornando a patamares anteriores à chegada do partido ao governo federal. No entanto, esse número não expressa a taxa de sucesso do PT nessas eleições, da ordem de 26%, superior à de 2004, quando o PT obteve 22,54% de taxa de sucesso, ao eleger 436 prefeituras das 1.934 disputados.
Há que se atentar para o fato que esse ano o PT disputou muito menos prefeituras do que vinha disputando: apenas 971, pouco mais de metade do número de municípios que disputou em 2012 (1.759), ano de maior sucesso para o PT, quando elegeu 639 prefeituras, 36,33% das disputadas.
Acompanhando o desempenho do PT nas maiores cidades, em 2012 o partido elegeu 23 prefeituras em municípios com mais de 150 mil eleitores. Nessa eleição, nos 74 municípios com mais de 150 mil habitantes em que o PT disputou, os resultados foram favoráveis em apenas quatro (Rio Branco (AC), Rio Grande e São Leopoldo (RS), Araraquara (SP). Em outros sete disputará o segundo turno: Vitória da Conquista (BA), Anápolis (GO), Juiz de Fora (MG), Recife (PE), Santa Maria (RS), Mauá (SP) e Santo André (SP). Obteve 5% de aproveitamento nas cidades desse porte em primeiro turno e 17% se considerado desempenho favorável no 2º turno. Em suma, o PT obteve ao todo 6.822.967 votos para prefeito em todo o Brasil, o que corresponde a 4,7% do eleitorado e 5.757.437 de votos para vereadores.
Sem dúvida a menor participação do partido administrando os municípios merece reflexão e autocrítica e, mais do que isso, a que se deve essa significativa redução de disputa, muito associada à desfiliação de quadros municipais importantes do partido. A desfiliação somada à redução de verbas para campanha inviabilizou candidaturas ou o sucesso delas. Da mesma forma, o incessante combate midiático ao PT, reforçando a associação de escândalos de corrupção unicamente aos petistas, fez crescer a rejeição, tornando-o o partido mais rejeitado pela opinião pública (38%, segundo o Ibope, em novembro de 2015) ao mesmo tempo que teve sua preferência rebaixada para 11% (Datafolha, julho de 2016).
Há que se observar que os resultados eleitorais também apontam para a necessidade de uma nova rearticulação das esquerdas, pensadas no plural. Se, para além do PT, considerarmos outros partidos de esquerda, ainda que tenhamos uma redução no número de municípios que elegeram candidaturas de esquerda, no cômputo geral, devido à redução das prefeituras petistas, temos o crescimento do PCdoB, de 56 prefeituras eleitas em 2012 para 87 nesta eleição, e do PDT, de 311, para 334, além da manutenção de 2 cidades governadas pelo PSOL e cinco que agora elegeram a Rede, se a considerarmos de esquerda (ou, pelo menos, não apoiadora do golpe), apesar do racha que sucedeu a eleição e que deve conduzir o partido mais para o centro no espectro politico.
Não se pode falar, portanto, em uma ampla derrota das esquerdas. Nas capitais, a vitória de Marcus Alexandre, do PT, em Rio Branco, a ida para o segundo turno de Freixo no Rio de Janeiro, Edmilson em Belém, ambos do PSOL, assim como de João Paulo, do PT, no Recife, e a chegada de Haddad, do PT, em segundo lugar em São Paulo, apesar da derrota, indicam que as esquerdas estão vivas a despeito da incessante investida do discurso conservador e neoliberal, imposto pelos golpes midiático, judicial e parlamentar.
Paralelamente, há o crescimento de várias direitas, com a grande vitória do oligopólio da mídia e de setores do empresariado. Isso evidencia dois projetos distintos de governo em disputa: um que pretende privatizar tudo, antipolítica, antipovo, empresarial, e o outro que prioriza o ser humano e deseja cidades mais humanas, acolhedoras, com projetos inovadores e inclusivos e mandatos propositivos, democráticos e transparentes.
Que a direita avança pelo país é fato. Grande parte dos municípios elegeram os que apoiaram o golpe e que não respeitaram a eleição presidencial de 2014, demostrando que não dão muito valor ao voto, à democracia e aos direitos sociais. Os resultados eleitorais mostram a necessidade da renovação das esquerdas e de uma nova composição de lideranças capaz de indicar novos caminhos às forças progressistas e mais combativas.
Em São Paulo, uma análise longitudinal do voto permite verificar a ausência de continuidade nas preferências e no que se deseja para a cidade. Em 1985, depois do bem avaliado governo Covas, São Paulo elegeu Jânio Quadros. Depois, em 1988, a militância petista elegeu Erundina contra Maluf. Maluf se elegeu, em 1992, contra Suplicy e, em 1996, Maluf elegeu Pitta contra Erundina.
Em 2000, após oito anos de estrago pita-malufista, São Paulo elegeu o PT com Marta, contra Maluf, mas substitui Marta por Serra, em 2004. Sem terminar o mandato, Serra passou a prefeitura para seu vice Kassab, em 2006, que manteve a continuidade e se reelegeu em 2008, em disputa contra Marta, ainda pelo PT.
Depois de mais outros oito anos de estrago, em 2012, São Paulo elegeu o PT com Haddad e, agora, em 2016, Dória foi eleito em 1º turno, com 53,29% dos votos válidos, contra 16,70% de Haddad, seguido por Russomano com 13,64%, Marta com 10,14% e Luiza Erundina 3,18%.
Sem reflexão ou debate, os paulistanos optaram por liquidar a fatura no 1º turno, elegendo um candidato com discurso antipolítico e empresarial, que se apresenta como gestor na campanha, mais uma vez esvaziada de propostas e com viés puramente eleitoreiro. A candidatura de Dória, no entanto, teve o maior investimento e a maior coligação partidária, feita da forma mais tradicional, qual seja, a cooptação dos partidos e oferecimento de cargos no governo municipal.
Diante de três candidatos com propostas (de esquerda ou direita) e que já governaram a cidade, o eleitor paulistano optou por um político que se vendeu dizendo que não é político, uma mentira. Dória foi fabricado por parte da sua legenda PSDB, mas também não aceito por outra parte dela, o que irá intensificar as disputas internas do partido e determinar os novos rumos das eleições presidenciais.
A abstenção também foi um fator decisivo para o resultado, que, somada aos votos nulos e brancos, corresponde a um número de eleitores superior ao dos que elegeram Dória. Ainda que pese a crescente insatisfação com a política e os meios tradicionais de fazê-la, o descrédito e a criminalização da política e dos políticos, foram agravados desde junho de 2013, quando a população começou a cobrar mais de seus representantes. Por outro lado, o próprio impeachment da presidenta Dilma e a fragilização da importância da eleição podem ter contribuído para acentuar esse comportamento.
Nesse último domingo, 21,8% dos eleitores paulistanos deixaram de ir às urnas. Entre os que compareceram, 16,6% não votaram em ninguém para prefeito. Resultado: 34,8% do total de eleitores não participaram da eleição, um crescimento de pouco mais de 3% quando comparado à eleição anterior. Em 2012, brancos, nulos e abstenções somavam 31,3% do total do eleitorado. Esse comportamento vem aumentando gradativamente: Em 2000, 2004 e 2008, os índices somados não chegaram a um quarto (24%, 21,6% e 23,5%, respectivamente).