Na última segunda-feira, representantes da Argentina, do Brasil, do Paraguai e do Uruguai reuniram-se em Montevidéu, num encontro informal para discutir a transmissão da presidência pro tempore do Mercosul para a Venezuela. O impasse teve início com as pressões do Paraguai e do Brasil. O Paraguai está na linha de frente das posições mais duras contra o governo de Nicolas Maduro, reclamando a aplicação das cláusulas democráticas tanto no Mercosul, quanto na Organização dos Estados Americanos (OEA). A posição, em parte, é uma reação à então decisão do Mercosul em 2012, ocasião na qual o Paraguai foi temporariamente suspenso devido ao golpe de Estado contra o presidente Fernando Lugo e à ruptura da ordem constitucional. O fato foi fundamental para a adesão plena da Venezuela como país membro, já que, na época, a maioria conservadora do Senado paraguaio vetara a incorporação do novo sócio.
No caso do Brasil, o chanceler interino defende o adiamento da transferência da presidência rotativa até agosto. A justificativa apresentada é que naquele mês vai vencer o prazo (acordado em 2012) para que a Venezuela adote uma série de normativas do bloco, sobretudo na área comercial. A rigor as duas medidas não estão relacionadas. Não há nenhuma sanção prevista se as normas não estiverem plenamente internalizadas dentro do tempo inicialmente estipulado. A internalização das normativas do bloco nos próprios membros fundadores é problemática, lenta e de baixíssimo conhecimento público. Embora Serra tenha apenas pedido o adiamento e não tenha se aprofundado nas consequências caso o prazo para a adequação normativa não seja cumprido, tal fato alimentaria as pressões políticas contra a Venezuela no Mercosul.
O Uruguai defende a manutenção das regras e a transferência da presidência para a Venezuela ainda neste mês de julho. O governo argentino expõe suas divisões internas, na medida em que a perspectiva da chanceler Susana Malcorra, semelhante à do governo uruguaio, foi suplantada pela posição de Macri, mais alinhada com o Brasil.
Na reunião da última segunda-feira em Montevidéu os países mantiveram suas posições e nada foi decidido. Uma nova conversa deve ocorrer nesta quinta-feira.
Em âmbito hemisférico, a ofensiva contra a Venezuela não é nova, sobretudo por parte dos EUA. Contudo, tiveram pouca ressonância ao longo dos anos 2000, no bojo do fortalecimento de uma série de iniciativas regionais autônomas por parte dos governos de esquerda da região - como a União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac). Com a vitória da oposição nas eleições parlamentares na Venezuela e o aprofundamento da crise econômica, política e social no país, com a reorientação da política externa para a integração a partir da vitória de Macri na Argentina e do golpe no Brasil, o cenário atual é muito mais delicado. O impasse no Mercosul se soma às iniciativa no âmbito da OEA e indicam pressões crescentes para isolar o governo Maduro. Paralelamente, a Unasul auspicia uma tentativa de diálogo entre governo e oposição, com mediação dos ex-presidentes José Luis Rodríguez Zapatero (Espanha), Martín Torrijos (Panamá) e Leonel Fernandez (República Dominicana). Há alguns acenos da oposição à possibilidade de diálogo (especialmente de setores social democratas mais simpáticos a Zapatero), mas há também divisões internas na Mesa de Unidade Democrática, que como um todo ainda não se mostrou comprometida com a iniciativa.
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