ESCUROde Ana Luísa Amaral
15,5x22,5cm | 80 páginas
Que terra é essa que se devenda no claro/escuro da poesia de Ana Maria Amaral. Densa na lírica, faca de rima fatiando o escuro perto/distante (E.C.)
As reinvenções de Ana Luísa inserem-se criticamente na atualidade de maneira profunda, incitando reflexões sobre a questão do gênero, a tradição lírica e o sentido político da poesia enquanto móbil da imaginação.
Mariana Ianelli
"Escuro é um poema em que Ana Luísa Amaral revisita a poesia a partir dos poetas que poeticamente escreveram a história de si próprios, como San Juan de La Cruz, ou a história da história, como William Blake, ou a história da poesia-feita-história, como Fernando Pessoa. A lucidez de Escuro canta a história nossa, que sempre na escola nos deixaram por contar" nos explica Maria Irene Ramalho
"Tudo começa a partir da memória pessoal, de um acaso e uma iluminação. À noite, ao deitar-se, outra noite se sobrepõe à do presente, e com ela, como num desfile de beleza e de terror, surgem, do passado, a alegria dos momentos da infância, como também a própria história, com raízes profundas na vida e na imaginação europeia – e por que não dizer, em nossa própria vida, já que, brasileiros, somos frutos deste mesmo sonho, para o bem e para o mal.
São camadas de tempo que a sonda sensível da poeta Ana Luísa Amaral, uma das mais importantes da poesia portuguesa contemporânea, parece arrancar do fundo do escuro e expor à luz do presente, logo no primeiro poema deste livro. Estas camadas, por assim dizer, coabitam neste mesmo momento de crise do capitalismo, em que lemos jornais e deparamos, atônitos, com “a violência de ser em cima desta terra”. Ou, como diz a poeta, tudo passa por um mesmo corredor. Ao lembrar a infância, “a cama e as cascatas frescas dos lençóis/ macios como estrangeiros chegando a país novo”, memória pessoal e história se encontram, entroncadas.
Seria impossível ler Escuro sem topar com Mensagem, de Fernando Pessoa, que já ecoava, em outro plano, Os Lusíadas, de Camões. Mas aqui a mitologia petrificada portuguesa parece ser questionada a partir do presente, quando o mito já se sabe mito e o que ocultava. “Comecei a formar-me/ a partir do mito”, escreve a poeta em “Nevoeiro” (que dialoga com outro nevoeiro, o de Pessoa).
Essa consciência ilumina as três partes de Escuro: “Claro-escuro”, com dois poemas, um de recorte lírico e outro com uma voz narrativa mais ampla, em que as raízes do processo do colonialismo europeu são postas do avesso, com saques e destruições “em nome de um equilíbrio novo”. Na parte central, chamada “Por que outra noite trocaram o meu escuro”, a poeta dá voz ao passado, seja a partir da “cobiça dos poderosos”, seja a da “sede dos mais pequenos por moedas”, além de pôr em cena as torturadas vozes femininas – daquela mulher, rainha ou não, que “estava ali, de lado”. Na última parte, “Em outra fala”, o futuro ecoa neste corredor do tempo, na busca de um “outro mundo de harmonia e sons”. E todas as vozes se reúnem, por fim, no lirismo de “O drama em gente: a outra fala”: “O lume que as sustenta,/ a estas vozes,/ é mais de dentro, e eu não sei o que dizer”.
A Europa que emerge destes poemas não é mais a contemplativa e melancólica de Pessoa, mas aquela que “não tem olhos, nem mãos, nem fita nada”. Uma Europa “sem esfinge que deslumbre”."
Escreve Heitor Ferraz Mello
lançamento
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