segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Crônica da Urda para o dia de São Nicolau

O DIA DE SÃO NICOLAU



                        (Sete anos atrás – 2007 – no seu dia, São Nicolau me trouxe nada mais nada menos que o meu cachorrinho Atahualpa, que naquela altura pesava tanto quanto um bife! Grande São Nicolau! Obrigada!)

Comemora-se São Nicolau no dia 6 de Dezembro e há muita coisa a ser dita sobre esse dia.
Para a Igreja Católica, São Nicolau foi um bispo polonês que viveu há muitos séculos. Era um homem justo e generoso, e gostava de fazer caridade incógnito, deixando saquinhos com moedas de ouro durante a noite, nos umbrais das janelas dos necessitados. Foi isto que li a respeito do santo, numa “Série Sagrada”, quando era criança. Só que, quando li isso, São Nicolau já era uma entidade muito forte para mim, e até fiquei um pouco decepcionada por saber que ele tinha vivido a vida sem graça de um bispo, quando poderia tê-la vivido na alegre companhia de Papai Noel.
Bem, de qualquer forma, ele foi uma pessoa muito forte, pois virou tradição e se perpetuou na memória de todas as crianças alemãs ou descendentes de alemães. E, na noite de 6 de dezembro, tantos séculos depois, São Nicolau continua visitando esses crianças e, incógnito, continua deixando suas dádivas, não mais moedas de ouro, mas balas, chocolates e castanhas, e é sobre a magia da noite de 6 de Dezembro que eu quero falar.
A memória me traz a noite de São Nicolau de quando eu tinha três anos, a primeira de que recordo. Meus pais nos orientaram, a mim e à minha irmã Mariana, a enfeitarmos nossos sapatos com as flores do jardim, e os colocamos na janela da sala de nossa casa pequena e aconchegante. Um grande mistério passou a envolver tudo depois daquele ato solene, e tínhamos o coração disparado enquanto jantávamos ouvindo o “Repórter Esso”, pois era noite de milagres, a primeira noite de milagres para mim. E, de repente, meu Deus, o susto! Grandes batidas nas paredes da nossa casa de madeira silenciaram as cigarras que cantavam, e puseram em disparada meu coração virgem de emoções fortes.
- São Nicolau ! – confirmou meu pai, fazendo-se tão assustado quanto nós, e nos agarramos a ele, chorando de medo, mas não por muito tempo. Um matraquear no chão de madeira da sala transformou o medo em pavor, e meu pai e minha mãe tiveram que nos acalmar para que fôssemos ver o que havia acontecido. E, milagre! – encontramos o chão da sala forrado de balas lindas e desconhecidas que algum vizinho ali jogara, e o medo e o susto passaram enquanto juntávamos aquelas balas maravilhosas vindas diretamente do além. Lembro-me, nos dias seguintes, de como ficava admirando aquelas balas chiques, envoltas em papéis lindos e coloridos, bem diferentes das triviais balas de coco-queimados que comprávamos na venda do vizinho seu Eugênio. Inesquecível primeira noite de São Nicolau, quantas outras vivi!.
São Nicolau foi-se adaptando às necessidades das nossas vidas. Quando aprendemos a escrever, deixávamos nossas cartas ao Papai Noel dentro dos sapatos, na janela, na sua noite. Ele além de levar as cartas, ainda enchia os sapatos de guloseimas, e fiz isso até ser uma adolescente bem grandona.
Outras adaptações foram sendo necessárias. Por exemplo, quando meu sobrinho Mteka era pequeno, morava em apartamento, e não entendia como São Nicolau poderia chegar até à sua janela. Lembro dos seus grandes olhos claros enquanto perguntava:
- Mas ele é mágico? Ele pode vir voando até aqui?
Claro que ele é mágico; São Nicolau tudo pode.
Nossa última criança foi minha sobrinha Laura, e muito festejamos o São Nicolau com ela. Comemorávamos em grande estilo, com jantar e amigos que tinham outras crianças, e São Nicolau comparecia sem falta, a bater nas portas, a jogar balas e chocolates no meio da sala, a deixar as crianças aterrorizadas e encantadas. Querido São Nicolau!
Observei, porém, ao longo da vida, que São Nicolau só existe, na nossa região, para as crianças que descendem de alemães. Em lugares como Lages/SC, por exemplo, São Nicolau não existe. Amigos que tenho em Itapiranga/SC, lá no fim do estado, cidadezinha de colonização alemã, garantem-me que lá São Nicolau é festejado igualzinho como o é em Blumenau, o que nos leva, de novo, às raízes alemães. É uma pena que todas as crianças não tenham São Nicolau! É um santo mágico, encantado, e que pode tudo. Fica a sugestão para as outras etnias: por que não dar São Nicolau para todas as crianças?


Blumenau, 27 de Novembro de 1995

Urda Alice Klueger

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