Música com Z
Artigos, reportagens e entrevistas (1957-2014)
Zuza Homem de Mello
Prefácio de Humberto Werneck
544 páginas
Lançamento_Segunda-feira, 26 de maio de 2014, às 19h30Livraria Cultura Conjunto Nacional - Teatro Eva Herz (Av. Paulista, 2.073 - São Paulo)Bate-papo com o autor e com o jornalista Alexandre Machado.Distribuição de senhas 1 hora antes do evento. |
Música com Z reúne 140 textos do jornalista, crítico, pesquisador, apresentador
de rádio, produtor e ex-contrabaixista Zuza Homem de
Mello, um dos maiores conhecedores de música em nosso país, escritos ao longo
de toda a sua carreira - das primeiras reportagens enviadas de Nova York, em
1957, até um artigo sobre os centenários de Caymmi, Lupicinio
Rodrigues e Aracy de Almeida publicado em 2014.
Focalizando
principalmente o jazz, a música popular brasileira e a norte-americana, o livro
traz as experiências de um crítico que conviveu com vários dos artistas
abordados, assistiu pessoalmente
às suas apresentações, entrevistou-os e até produziu seus discos e shows.
Estamos, portanto, diante do testemunho de um autor que vive de muito perto a
cena musical. Com a generosidade e a paixão que lhe são características, Zuza
nos transporta por meio de seus escritos não apenas aos palcos, mas também aos
bastidores, camarins e estúdios que frequentou, compartilhando conosco o calor
e as revelações de cada um desses momentos.
Uma
entrevista inédita com Charles Mingus, o relato de
uma apresentação surpresa de João Gilberto, um encontro com Chet
Baker, a análise da produção de Noel Rosa, a história da canção "As Times Goes By", a primeira entrevista
de Itamar Assumpção, um estudo sobre a carreira de Frank Sinatra, o último show
de Elis Regina, um perfil de Miles Davis... Não é pouco o que o leitor poderá
aprender e saborear nestas páginas, redigidas por alguém que, como lembra
Humberto Werneck no prefácio, "esteve sempre no lugar certo, e na hora certa,
vendo e ouvindo o que cada um de nós adoraria ter tido a oportunidade de ver e
ouvir".
Sobre o autor_ Zuza Homem de Mello nasceu em São Paulo, em
1933. Inicia-se no jornalismo em 1956, assinando uma coluna de jazz semanal
para a Folha da Noite. Após um
período de estudos em Nova York, volta ao Brasil e ingressa na TV Record, onde
permanece por cerca de dez anos trabalhando como engenheiro de som e atuando
como booker
na contratação de atrações internacionais. Entre 1977 e 1988 produz e apresenta
o premiado Programa do Zuza, na Rádio
Jovem Pan AM, e faz crítica de música popular para O Estado de S. Paulo. Trabalha também como diretor artístico de
shows e festivais e produz discos de Jacob do Bandolim e Elis Regina, entre
outros. Integra a equipe do Festival de Jazz de São Paulo (1978 e 1980), sendo
curador do Free Jazz Festival desde sua primeira
edição, em 1985, e de seus sucessores, Tim Festival e BMW Jazz Festival. É
autor dos livros Música popular
brasileira cantada e contada... (Melhoramentos, 1976, relançado pela WMF
Martins Fontes em 2008 com o título Eis
aqui os bossa-nova), A canção no
tempo, dois volumes em coautoria com
Jairo Severiano (Editora 34, 1997-98), João
Gilberto (Publifolha, 2001), A Era
dos Festivais (Editora 34, 2003) e Música
nas veias (Editora 34,
2007).
Prefácio_
por Humberto Werneck
Antes que lhe
caia o queixo - pois é de cair o queixo o livro que você tem nas mãos -,
prepare-se para sucumbir ao feio sentimento da inveja. Inveja que, no caso, tem
o atenuante de ser benigna, e cujo objeto é o camarada que pôs no papel cada
uma das palavras reunidas neste volume felizmente alentado.
Por que
inveja? Falo por mim, mas quem sabe por você também: porque o Zuza Homem de
Mello, esse danado, esteve sempre no lugar certo, e na hora certa, vendo e
ouvindo o que cada um de nós adoraria ter tido a oportunidade de ver e ouvir.
Ainda bem que não guardou só para ele o visto e o ouvido!
Pode ser,
dirá você, que eu esteja exagerando, risco a que um prefaciador apaixonado
tantas vezes pode sucumbir. Então vamos aos fatos, ao móvel de minha
irremediável e justificada inveja, fatos esses que são fáceis
de colher, meio ao acaso, em qualquer ponto das páginas que se seguem.
Saiba, por
exemplo, que aos 24 anos de idade o Zuza ocupava uma das cadeiras do Carnegie
Hall, em Nova York, naquela noite de setembro de 1957 em que o JATP, o Jazz at The Philharmonic, pôs em cena
uns camaradas chamados Oscar Peterson, Coleman Hawkins,
Lester Young e Stan Getz, além das feras do Modern Jazz Quartet. Poucas
semanas depois, olha o Zuza no mesmo cenário, dessa vez todo olhos &
ouvidos para Dizzy Gillespie
e Thelonious Monk, para Billie Holiday e para um
promissor e ainda escassamente conhecido cantor e pianista de nome Ray Charles.
Foi naquela noitada de 29 de novembro de 1957, aliás, que o Zuza viu pela primeira
vez se apresentar um tal de Chet
Baker.
Outro músico
que por essa época lhe chamou a atenção: um jovem sax-tenor, "calado e não
muito expansivo", integrante do quarteto de Thelonious
Monk depois de haver brilhado no quinteto de Miles Davis, talentoso o bastante
para criar no crítico brasileiro "a firme impressão" de que poderia se tornar
"um magnífico músico de jazz". Nome do cara: John Coltrane.
Se você vê
deslumbramento nas linhas acima, ponha, insisto, na conta exclusiva do
prefaciador, já que o Zuza, profissional calejado, nunca foi de se embevecer ao
ponto de sacrificar o rigor. E não porque tenha, hoje, quase seis décadas como
repórter e crítico musical. Ele já era assim lá nos começos, como se pode
constatar na leitura de seus primeiros escritos na imprensa, vários deles
enviados em 1957 e 1958 de Nova York - cidade onde o jovem baixista
profissional da noite paulistana, deixando para trás um curso de engenharia,
tinha ido estudar musicologia na Juilliard School of Music, período em que
frequentou também a não menos célebre School of Jazz, em Tanglewood.
Foi ótima
ideia do Zuza conservar e reunir aqui uma seleta de
seus amarelecidos recortes nova-iorquinos, e tantos outros acumulados a partir
de então, ao longo de décadas e igualmente submetidos, agora, à peneira da
maturidade e a um cuidadoso trabalho de revisão. Sim, pois o ouro recolhido no
caminho foi ainda mais refinado.
Não estou
autorizado a falar por ele, claro, mas posso afirmar que o Zuza, muito à margem
da vaidade e nostalgia de escribas que se sentem autores das tábuas da lei, viu
excelentes razões para sacar velhos textos de seus arquivos. Constate você
mesmo que todos eles conservam o viço e, sem rugas, são capazes, ainda, de
suscitar leitura atenta e proveitosa. Sem falar, é claro, na óbvia importância
documental que têm.
Quem escreve
regularmente na imprensa se dá conta às vezes de que este ou aquele escrito,
ainda que produzido no sufoco dos deadlines das redações, mereceria um pouco mais de sobrevida nas
bancas de jornais e revistas, antes de cumprir, independentemente do valor
jornalístico, histórico e até literário que possa ter, o inglório destino de
embrulhar legume ou peixe ali no sacolão.
Para
felicidade geral, Zuza fez como o cronista e romancista Fernando Sabino (um
aplicado baterista amador de jazz, sabia?), quando, já próximo dos 80 anos,
decidiu mergulhar no cafarnaum de seus recortes de imprensa para de lá trazer o
que ainda pulsasse qualidade, reunindo o melhor desses achados nas seiscentas e
tantas páginas do delicioso Livro aberto.
O que se dá
em boas coletâneas, como a de Sabino e esta de Zuza Homem de Mello, é que,
postos lado a lado, textos de qualidade não só se desincumbem
a contento, cada um deles, como, se bem justapostos, trabalham uns pelos outros - se você me permite o lugar-comum: como as
pedrinhas bonitas que, somadas, irão formar painel ainda mais belo.
Uma simples
passada de olhos pelo sumário já permite ver o quanto é rico e imponente o
mosaico montado pelo Zuza - e, coisa nem sempre encontrável entre os que se
ocupam da crítica de qualquer arte, isento de sectarismo e preconceitos.
Percorra as sete seções em que se divide Música
com Z e diga se há algum nome verdadeiramente grande da música, seja ela
brasileira ou de outros cantos do mundo, que não tenha sido aqui contemplado -
de Cartola a Charles Mingus, de Tom Jobim a Duke
Ellington, de Carmen Miranda a Carmen McRae, de Maria
Bethânia a Alberta Hunter, de Milton Nascimento a Charles Aznavour, de João
Gilberto a John Coltrane, de Jackson do Pandeiro a
Dexter Gordon, de Gal a Diana Ross, de Chico, Gil e Caetano a quem mais possa
você imaginar de bom.
O rol dos
norte-americanos, por exemplo, está longe de esgotar-se nos gigantes aí acima
mencionados, nem se esgotará nos que serão adiante
enumerados. Entre eles, Willie Nelson, que o Zuza viu
cantar em Las Vegas, no ano de 1982, e Diana Ross, no
Valby-Hallen de Copenhague, em 1985. Mais perto de
nós, Frank Sinatra e Alberta Hunter no mitológico Bar 150, do Hotel Maksoud
Plaza, em São Paulo - casa onde ecoaram também o piano e a voz daquele que o
nosso crítico tem na conta de "o mais irresistível saloon singer de todos
todos os tempos", ele mesmo, Bobby Short.
E eis que
cabe aqui um parêntese não apenas musical: para Zuza Homem de Mello, o hoje extinto
150 veio a tornar-se ainda mais inolvidável ao cabo da noitada de setembro de
1983 em que, para comemorar 50 anos de vida, ele reuniu ali igual número de
casais amigos. Num fecho apoteótico, foi ao som de "Happy
Birthday to You", na interpretação de Bobby Short, que o aniversariante
soprou as velas.
E como
esquecer a fulgurante passagem pelo 150, no mesmo ano,
da "maior cantora de jazz de seu tempo"? - Betty Carter, claro. Trata-se,
também neste caso, de opinião solidamente sedimentada, pois Zuza a conhecia
desde fevereiro de 1958, de uma jam session do Birdland,
em Nova York. Haveria de reencontrá-la no início da década de 60, numa de suas
incontáveis revisitas à cidade, dessa vez no Apollo Theatre, dentro de um programa luxuoso ao ponto de incluir também
Ray Charles. "No palco, a figura de Betty não ajudava muito - uma magricela
desengonçada sem charme algum", recordará Zuza anos depois. "Provavelmente
seria dispensada de cara por um produtor de megashows.
Todavia, sua voz doce caía de encomenda para contrastar com a voz meio rouca,
com os gemidos e lamentos que vinham do fundo da alma do gênio."
A profusão de
detalhes, neste e em muitos outros casos, se deve não apenas à boa memória de
Zuza Homem de Mello como também à excelente iniciativa de acrescentar, no pé de
vários dos textos deste livro, notas redigidas em 2014 com o objetivo de
atualizar e enriquecer antigos escritos, e até para humildemente arrolar
supostos deslizes imputáveis ao verdor de um profissional em formação.
Sempre
oportunas e interessantes, as notas supervenientes trazem às vezes ao leitor de
hoje notícias menos boas - ou mesmo francamente
lamentáveis: ao repassar, 55 anos depois, reportagens de julho de 1958 em que
mapeou templos do jazz em Nova York, Zuza Homem de Mello nos informa que de
todos eles apenas um, o Village Vanguard, na 7ª
Avenida, seguia atuante, sendo que o outrora glorioso Birdland,
agora em outro endereço, se desvirtuou tanto que se converteu em casa de shows
de striptease.
Lembrança
puxa lembrança - e as saborosas notas de Zuza volta e meia
se encompridam, do que ninguém vai reclamar, ao contrário, pois tudo é sempre
muito pertinente e bom de ler. No caso do cantor Emílio Santiago, por exemplo,
o post scriptum
de 2014 resultou bem maior que o comentário que o suscitou em 1979. Tantos anos
depois, o crítico pôde nos dar o que na breve resenha de um disco não teria
cabimento. "Fiquei literalmente chapado quando assisti Emílio Santiago pela
primeira vez, num inesquecível show com Alcione, no Canecão do Rio de Janeiro",
anotou ele. "Os solos de cada um eram de assustar, em
dupla suas vozes enchiam o espaço em alto nível e ainda havia como bônus os
surpreendentes solos de trompete da cantora."
Emílio e
Alcione são dois na imensa, completíssima galeria dos bons intérpretes e
compositores cuja arte ocupa Zuza Homem de Mello nas páginas deste Música com Z, distribuídos em sete bem
montadas divisões. Uma delas, a parte V, intitulada "A pedidos", nos
presta o imenso favor de recolher textos que jaziam espalhados por encartes e
contracapas de discos, programas de espetáculos musicais e até releases escritos para informação das
redações de revistas e jornais, tudo isso de comprovada resistência ao tempo.
Outra seção,
abrindo o livro e o apetite do leitor, tem por tema canções e momentos que,
para o Zuza e tantos de nós, são inesquecíveis - pense em joias como "As Time Goes
By", "Cidade maravilhosa" ou "Tenderly". Todo um bloco do livro é dedicado a uma seleta
de textos produzidos pelo repórter praticamente desde aquele
26 de setembro de 1956 em que ele, aos 23 anos, fez sua estreia no
ofício ao cobrir, morra de inveja, a passagem da orquestra de Dizzy Gillespie pelo Teatro
Santana, de São Paulo.
Como repórter
ou crítico, Zuza foi J. E. (de José Eduardo) Homem de Mello até abril de 1978,
quando, ao iniciar sua colaboração no jornal O Estado de S. Paulo, teve a ótima ideia de usar como profissional
o apelido que traz da infância.
Entrevistador
capaz de extrair o melhor que um entrevistado possa render (no rádio,
inclusive, durante os dez anos em que manteve na Jovem Pan, de São Paulo, de
segunda a sexta-feira, o Programa do Zuza),
nosso crítico teve à sua frente uma infinidade de grandes nomes da música,
brasileira e estrangeira, duas dezenas deles reunidos aqui numa seção em que
uma entrevista até agora inédita de Charles Mingus
está longe de ser o único pitéu. Alguns deles, quem sabe, poderiam estar também
na seção que fecha Música com Z,
reservada a artistas que, mais do que "figuras", são "figuraças".
Mas não me
peça, por favor, que esclareça a diferença entre uma coisa e outra. Figura
& figuraça que é, o Zuza
vai explicar com muito mais competência. Depois, tem isto: como aquele
entusiástico mestre de cerimônias que se estendeu além da conta, fazendo brotar
na sala um burburinho de impaciência, este prefaciador por fim se manca. Chega
de tentar apresentar o que disso não precisa, vamos logo ao que interessa!
Projeto realizado com o apoio do Governo do Estado de São Paulo,
Secretaria da Cultura, Programa de Ação Cultural 2013.
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