quinta-feira, 9 de maio de 2013

Venha conhecer meu paraíso!!!



Quando eu a reformei e a deixei a meu gosto, fi-lo pensando no que alguém me dissera: “Cuide bem da sua penúltima morada, porque da última os outros cuidarão”. Portanto, fi-la para passar nela o resto da minha vida.
                                   Acontece que depois de poucos anos surgiu no meu horizonte um outro lugar onde acho que vai ser minha penúltima morada, e lá é um paraíso inesperado, lugarejo com quase 300 anos de história, sem hotéis, sem edifícios, sem pousadas, com sua igrejinha mui antiga, pescadores, maricultores, bichos-grilos e outros habitantes que, como eu, acabam por voltar às origens do mar (um dia todos nós saímos do mar!) para viver a intensidade das últimas décadas, sabe-se lá se não a intensidade de só alguns anos que devem ser muito bem vividos! Esse paraíso está a apenas 10 minutos do centro de uma cidade de 200.000 habitantes, com tudo o que gente velha precisa: médicos, bancos, etc. Portanto, já deixo explicado o porquê de estar querendo abandonar este pequeno paraíso que estou querendo vender e, que para começo de conversa, está completamente livre de enchente, barranco ou ribeirão, coisa que já o torna MUITO atraente, em se tratando da cidade de Blumenau/SC, lugar dado a tantos desastres naturais.
                                   Qualquer construção poderia estar em tal lugar privilegiado, no entanto, mas nenhuma, claro, seria como a minha casinha branca e rosa, que tem na porta o anúncio de que ali mora um cão feliz, e embora não haja anúncio, também ali mora uma gata muito dengosa e caçadora, afeita a vir do mato dos fundos com ratos de diversos tamanhos carregados na boca, e que são devidamente devorados na garagem para dois carros.
                                   Esta minha casinha é encostada em outra, que é encostada em outra, e depois outra e outra, e elas formam como que uma muralha fechada por um portão que se abre com controle remoto e onde só entra quem mora no pequeno moderno burgo ou quem é convidado de algum dos moradores, coisa muito segura, onde a gente compartilha um jardim comunitário, um salãozinho de festas e um parquinho de diversões com quadra de macia areia, onde crianças muito educadas jogam futebol ou vôlei nos finais das tardes, maravilhosas crianças que jamais ultrapassam o portão da gente sem pedirem licença e que no dia primeiro de dezembro já estão de férias, pois, de tão estudiosas, passam todas sem exame. Fico fascinada com alguns meninos que são mais meus amigos que os outros, e que tudo manjam de mapas, de geografia e de história! Não é em qualquer lugar que se encontram vizinhos assim, nem meninas pequenas que leem poesia e uma há que até está a escrever um livro, apesar dos seus oito anos!
                                   Minha casinha se separa da ruazinha onde está por uma cerquinha branca, e tem um pequeno jardim de grama pelo de urso, com um pé de lindas flores amarelas e outro de boldo, pois dou chá de boldo para minha gatinha, quando ela come ratos demasiados, para que melhore do estômago.
                                   Do lado do jardim, há a varanda que me serve de sala de visitas quando chegam as pessoas do coração, com suas cadeiras brancas e sua mesa branca com toalha de renda, e onde posso trabalhar com um lap-top. As crianças das casas vizinhas costumam vir até à cerca da minha varanda para me contar seus sonhos e seus sucessos – é muito lindo saber da imaginação que há dentro de cada uma!
                                   Depois vem a sala, como em todas as casas, para as visitas mais de cerimômia ou para os dias frios. Na verdade, esse andar inteiro mede 100 m2, e são três quartos luminosos, dois banheiros onde o vento das manhãs seca as toalhas de banho em qualquer estação, a sala de jantar, a cozinha e área de serviço. O arquiteto que fez a reforma para mim disse que hoje se constroem apartamentos de três quartos em apenas 50 m2 – nem consigo imaginar tal coisa!
                                   Pois é, daria para uma família média morar confortavelmente só nesse piso – não há muito terreno atrás, coisa só de um metro e meio, mas como a floresta contígua é área de preservação permanente (há uma nascente em algum ponto, lá dentro da mata  - Floresta Atlântica legítima, se desdobrando em quadras e quadras, a partir dali, e virando todo um morro até o outro lado), é como se o terreno nunca acabasse.
                                   Não é só isso a casa, porém! Da sala de jantar, toda branca e rosa, passando por uma escada de canela preta de oitenta anos de uso, salva de uma demolição (como aquelas escadas de filme – ou da casa da vovó), vai-se ao outro piso, e lá são mais setenta metros quadrados de área, com os fundos em vidro, para que melhor se possa observar atentamente as cotias, os macaquinhos, os tucanos de longos bicos, as inúmeras outras aves – bichos mais simples, como gambás e lagartos, a gente nem conta. Como era para ser minha penúltima morada, tomei cuidado com a segurança, coloquei extensa grade de ferro protegendo aquele vidro todo (pelo lado de fora) e cuidei para pintar a grade de verde escuro, para que não aparecesse diante da floresta. Aliás, é bom lembrar que todas as entradas da casa estão devidamente gradeadas em ferro, evitando qualquer susto futuro.
                                   Setenta metros quadrados é um bocado de metro – em tal espaço também existe o espaço para secar roupa, genialmente criado pelo arquiteto que ali trabalhou, e um banheiro rosa e branco, onde, vez ou outra, quando desço as escadas em silêncio, pego alguma fadinha tomando banho, com a água do chuveiro batendo em suas asinhas translúcidas – são fadinhas muito tímidas, costumam fugir para a floresta quando são percebidas. Mas é uma paixão encontrar alguma delas ali!
                                   Ah! E não posso esquecer a janelinha feita para o meu cachorro, ao rés-do-chão, com sua varandinha gradeada e seu telhadinho, onde ele se refestela a espiar e acoar os animaizinhos da mata.
                                   Nesse grande espaço do outro piso eu fiz uma biblioteca, um escritório – pensava em melhorar mais, fazer uma sala alcatifada para a música e a leitura – adoraria que quem comprasse a casa utilizasse tal área para algo ligado à Arte, mas sabe como é, lá se pode fazer praticamente qualquer coisa.
                                   Não posso esquecer que minha casinha rosa e branca tem um ponto central de luz, um espaço dentro dela, coberto por uma claraboia translúcida, que a ilumina toda por dentro. Nas horas do meio do dia, a luz do sol a alcança em todos os níveis – e também não dá para esquecer que ela possui a possibilidade de se fazer ainda mais um piso, como alguns vizinhos já fizeram... e nem dá para esquecer das manhãs em que acordo e há quatro tucanos pousados na janela da cozinha...
                                   Quem quer comprar? Eu estou querendo ir lá para a beira do grande mar-oceano...
                                   Blumenau, 30 de abril de 2013.

                                   Urda Alice Klueger
            Escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR.

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