quinta-feira, 22 de novembro de 2007

São Paulo de Piratininga , capital dos Bandeirantes








POR EDUARDO CRUZ

De um certo modo ficou difícil contar alguma novidade acerca depois das comemorações dos 500 anos de Brasil.
Mas a história está aí , e dependendo da idade do cidadão e do livro didático do seu tempo de escola , de Capistrano de Abreu a Borges Hermida , temos muito desses 500 anos de Brasil para rever. De 1500 a 1640 , a chamada fase litorânea temos o delicioso banquete de Dom Pero Fernandes Sardinha , bispo acepipe dos Caetés em 1556. E temos Mem de Sá que mandou exterminar aquela nação inteira só por causa do regabofe. Temos a chegada dos jesuítas de dúbia história e mais à frente expulsos de Portugal e suas colônias. Temos o fracasso das capitanias hereditárias , onde já se praticava ao que parece o nepotismo desbragado e uma guerra fiscal lá a seu modo.
Mas nada disso daria uma dimensão do surgimento do verdadeiro Brasil. Aparentemente eterna referência do expansionismo capitalista por toda a América Latina . Estamos falando da fase bandeirista que em sucesso folhetinesco foi às tevês e reapresentou ao grande público os bandeirantes e as atividades e vocações do maior centro comercial e financeiro do país que é a cidade de São Paulo.
O curioso em contar-se a história dos 500 anos através dos Bandeirantes , é encontrar no presente as mesmas mazelas do passado , pagar nossa divida histórica com os índios e apresentar alguns heróis como pouco ou nada patriotas e merecedores de CPIs históricas... “sim, porque há documentos que provam “...
Na visão clássica , “partindo do litoral, os colonos foram aos poucos incorporando o território da América portuguesa ao âmbito do Império: mundo sempre em movimento onde as hierarquias sociais se superpunham com maior flexibilidade e rapidez; onde os limites geográficos foram até meados do século XVIII, fluidos e indefinidos” , escreve Laura de Mello e Souza em Formas provisórias de existência: a vida cotidiana nos caminhos, nas fronteiras e nas fortificações. Em sua visão , em decorrência do caminho , do movimento, constituiu-se a civilização paulista. Mas que civilização era essa aparentemente cheia de organização e desorganização , rica na ação e pobre nas posses, européia na índole , mas xenófoba na expropriação . Deixemos de conjecturas e vamos aos fatos.
Os primeiros jesuítas a desembarcarem no Brasil eram liderados pelo padre Manoel da Nóbrega e vieram dar com seus costados e sua missão “de salvar os índios” em 29 de março de 1549.Vieram com o governador geral Tomé de Souza e desde logo bateram de frente com os colonos que cá estavam. Para os colonos os “negros da terra” eram mão-de-obra indispensável, barata e servil. Para os jesuítas “alminhas a serem salvas a qualquer custo” , que lhes fossem cobertas as vergonhas , que não fornicassem com os colonos e que cultivassem para eles (jesuítas) suas terras .
O Padre José de Anchieta chegou ao Brasil em 1553 , e embora considerado um “santo” por muitos, consta de seus escritos a seguinte frase – “ Para esse gênero de gente não há melhor pregação do que a espada e vara de ferro”. Conta a lenda que quando era refém dos Tamoios em Ubatuba (SP) escrevia longos poemas devocionais na areia , já que não tinha papel . A lenda persiste garantindo que era a sua forma de memoriza-los . Melhor essa explicação do que inventar um copista que diligentemente ia recuperando os textos antes da maré .

Pois bem, mas é através deles dois que temos a fundação do que veio a chamar-se São Paulo de Piratininga. Quer dizer, não é bem assim – Na história oficial consta que “a fundação de São Paulo insere-se no processo de ocupação e exploração das terras americanas pelos portugueses, a partir do século XVI. Inicialmente, os colonizadores fundaram a Vila de Santo André da Borda do Campo (1553), constantemente ameaçada pelos povos indígenas da região. Nessa época, um grupo de padres da Companhia de Jesus, da qual faziam parte José de Anchieta e Manoel da Nóbrega, escalaram a serra do mar chegando ao planalto de Piratininga onde encontraram "ares frios e temperados como os de Espanha" e "uma terra mui sadia, fresca e de boas águas". Do ponto de vista da segurança, a localização topográfica de São Paulo era perfeita: situava-se numa colina alta e plana, cercada por dois rios, o Tamanduateí e o Anhangabaú. Nesse lugar, fundaram o Colégio dos Jesuítas em 25 de janeiro de 1554, ao redor do qual iniciou-se a construção das primeiras casas de taipa que dariam origem ao povoado de São Paulo de Piratininga. Em 1560, o povoado ganhou foros de Vila e pelourinho mas a distância do litoral, o isolamento comercial e o solo inadequado ao cultivo de produtos de exportação, condenou a Vila a ocupar uma posição insignificante durante séculos na América Portuguesa.
Já para Benedito Lima de Toledo professor-titular de História da Arquitetura da FAU-USP , o núcleo de São Paulo de Piratininga ao fim do século XVI era formado por um triângulo composto em seus vértices pelo Colégio dos Jesuítas, pelo Mosteiro de São Bento e pela Igreja de São Francisco( incluindo a igreja do Carmo). O formato triangular faz crer que a cidade cresceu dentro dos muros, que foram por vezes mudados para darem vez à expansão . E porque dos muros , em um lugar tão longe da costa? Os muros de taipa de pilão era para se protegerem do índio inimigo. Aquele que aprendemos nos livros ser dócil e amigo.
O mesmo que era a única fonte de sustento das 370 famílias de Piratininga, que a partir de 1571 , graças à iniciativa do capitão-mor de São Vicente, Jerônimo Leitão , puderam empreitarem-se no negócio da captura dos “negros da terra” . Na verdade São Vicente , antes de ser fundada por Martim Afonso já era conhecida como “porto de escravos” devido ao tráfico promovido por João Ramalho , e um embuçado histórico conhecido como Bacharel de Cananéia. Dizem que era um degredado. Muito citado , mas de identidade incerta e não sabida .
Em tempo, Piratininga quer dizer peixe seco em referência ais cardumes que ficavam à lama a secar depois das águas baixarem. O triângulo era dos poucos lugares desse núcleo realmente seco , pois cercado por rios que viviam em constantes alagamentos o resultado era caótico , como os que hoje chamamos de enchente e provocam 140 km de consgestionamentos.
Mas esses , que segundo alguns autores eram piratas do sertão também viam a meter-se em rusgas . Primeiro pelos índios , depois pelo ouro. E uma resistência ferrenha em seguir as regras ditadas pelo reino português. Os reinóis , eram inimigos declarados. É curioso ler em “A Muralha” de Dinah Silveira de Queiroz , a personagem , antes frágil , Basília , comportar-se como uma vingadora da família .”O ódio a excitava, tornava-a cheia de ânimo. Agora sua família estava reduzida à Mãe Cândida e a ela própria, já que Leonel era um meio-morto, um desamparado, largado de si mesmo e de Deus, solto no mundo e esquecido de sua gente. Lembrava-se das palavras de Borba Gato: ‘Os paulistas terão contra eles inimigos de assombrar’”. Isso em um romance histórico considerado até pueril por alguns críticos .
Borba Gato também é personagem em “O retrato do rei” de Ana Miranda onde fica claro que paulistas e reinóis o respeitavam . Talvez não o façam hoje ao ver a sua horrenda estátua na estrada do bairro de Santo Amaro , antiga cidade que ajudou a fundar e que foi absorvida por São Paulo. Mas no livro a autora nos trás com cores mais fortes o início do ciclo do ouro e a incrível Guerra dos Emboabas que durou três anos . Uma história cruel de cobiça e nenhuma ideologia , digamos , bandeirista.
No Rio de Janeiro , mesmo durante a missa , no sermão o tema viria a ser o ouro. Na Igreja do Carmo “embora tivessem a expressão grave e contrita, poucos tomavam seriamente o que dizia o sermonista. Quem, entre aqueles não dedicava a vida a acumular riquezas? Viviam regaladamente, nos prazeres. Engordavam seus corações em dias de matança.” Ainda no livro , Dom Fernando explica os paulistas ...”Os paulistas são selváticos, prima. Bravos, donos de uma truculenta liberdade, consideram-se diferentes dos outros moradores do país, o que não deixa de ser verdade. São rudes por fora e gentis por dentro, o contrário do que costumamos ser. Vaidosos, matam-se por uma honra ou distinção. Descobriram o ouro nos sertões, mas não sabem retirá-los das águas...”
Se eram rudes em estilo até tinham seus porquês. Alguns historiadores contam que enquanto as capitanias do norte eram servidas com seda, Fernão Cardim nos conta que os moradores sofriam por falta de navios. Em 1585 estavam por exemplo, completamente por fora da moda e ainda usavam o algodão tinto como tecido. Também como pensar em moda quando se lê por exemplo em Anchieta que “ a quarta vila na capitania de São Vicente é e Piratininga, que está 10 a 12 léguas pelo sertão e terra a dentro. Vão lá por umas serras tão altas que dificultosamente podem subir nenhums animais e os homens sobem com trabalho e às vezes de gatinhas por não despenharem-se”. Menos que nos atuais congestionamentos de fim de semana é claro.
Mas quem deliciosamente nos conta um pouco dessa vila de 446 anos e por isso mesmo grande co-participante deste 500 anos de Brasil é Belmonte. Este magnífico contador de histórias e ilustrador chamava-se Benedito Carneiro Bastos Barreto e jornalista paulistano interessou-se por contar as estranhas histórias de Piratininga e foi o criador do personagem “Juca Pato” , hoje transformado em prêmio que até o presidente Fernando Henrique já recebeu...
Mas a grande obra desse caricaturista é sem dúvida a raridade bibliográfica “No tempo dos Bandeirantes que foi reeditado pelo governo do estado de São Paulo. Em sua apresentação Belmonte dizia que o livro não era propriamente, um livro de História, infalível e definitivo...Quanto aos historiadores, estou certo de que perdoarão o humorista curioso que, com tanta sem-cerimônia, mas com a melhor das intenções, lhes invadiu os domínios”.
E que bela invasão...como a dos índios Carijós , que obrigaram os moradores a fortificarem a vila que nascia ainda sem nome de ruas e praças que são apenas pateos e terreiros.”No alto da colina, encerrada dentro de um triângulo, está a vila”. Ficamos então sabendo que nela ruas sem nome, atalhos que serpenteiam barrancos, “que se despenham pelos alcantís, que vão ligar-se lá embaixo com os caminhos que levam ao Guaré, aos campos de Piratininga e de Santo Antônio, a Ibirapuera, Pinheiros, Ururaí, ao caminho do sertão e ao caminho do mar.”
Algumas ruas e seus nomes sobreviveram aos séculos – “Rua de Sào Bento para Sào francisco, rua que vai para a direita para Santo Antonio, rua que vai para a Nossa Senhora do Carmo, rua do Carmo, rua que vai para a matriz” . Mas a coisa podia ficar confusa quando era “na rua do meu irmão Fernão Pais, rua onde mora Pedro Furtado, na rua pública desta vila, rua que vai para o Anhamgabaú ( que era um rio , e que hoje vez por outra vira um), rua detrás da casa de Aleixo Jorge ( e dessa nem queremos saber de histórias). São Paulo também era conhecida como São Paulo do Campo e era pobre, pobreza essa só atenuada pelo ciclo do ouro.
“Mas os forasteiros afluem””, continua Belmonte e mesmo 1633, em meio à penúria chegam gentes “do litoral, de Santos e sào Vicente, e não poucos dp Sul, do Guaíra e do Paraguai, embora o façam pelo caminho proibido. E já no fim do século, a sua população sobe a quase 4000 almas”. Entre elas , muitos muambeiros.
Grande número de locais próximos tinham nomes indígenas , tudo parecia ficar muito longe. Os mais ricos além das suas propriedades mantinham uma casa na vila. “Morando tão longe assim , não é por ociosidade que os paulistas pouco aparecem na vila, principalmente quando é forçoso andar por caminhos fragosos.O rude bandeirante que , a todo momento, rompe a mata e vai parar no Paraguai, no Amazonas ou no perú, parece não
Ser amigo do meio têrmo. Ou vai muito longe ou não vai.”
Mas a verdade é que os “caminhos fragosos” dão nos nervos. E com tantos rios e riachos sujeitos a enchentes , os caminhos alagados as pontes arruinados , não há quem possa. Já aquele tempo , na Câmara os apelos às autoridades se repetem. “Apelos ao senhor procurador: ...requeeu que se fixassem quartéis para se fazer a ponte do guerepe...E a ponte que está debaixo desta vila chamada anhamgobaí...E que se concerte a ponte da tabatinguera...E a ponte do ribeiro anangabaú caminho de peratiningoa... “
Além dos apelos , há de se notar que muitos locais séculos depois conservam o problema , e que também os escribas não primavam pela padronização dos nomes .

terça-feira, 20 de novembro de 2007



Retornando a Marc Ferro, o motor de sua série de palestras que culminaram no livro foi um debate televisivo sobre Joana D' Arc. Para enfrentar tal façanha leu todos os bons livros sobre assunto incluindo a obra de dois historiadores ingleses, Edward Lucie Smith e Robert Greenblatt que abordavam uma questão que jamais havia pensado. "Apoiados no depoimento de Jean d'Aulun, um dos companheiros de Joana d'Arc, lembravam que 'ela não tinha os contratempos habituais das jovens mulheres' nem atração pelos rapazes. Fico sabendo,então, por esses autores anglo-saxões, que algumas moças podem vir a ter atordoamentos, 'visões' e não sei mais o quê."
Chegando ao debate Ferro encontrou além do arcebispo de Rouen, conhecidos aduladores de Joana d'Arc, e em sua hora de falar ... "senti de repente minha boca congelar, meus lábios tremerem e respondi:- na Rússia, Joana d'Arc era considerada uma heroína nacional, da estirpe de Alexandre Nevski...- e não pude emitir mais nenhum som. Naquele dia, compreendi o que era um tabu: aquilo sobre o que se silencia, por medo, por pudor, confirma Alain Rey. Diferencia-se, com certeza, da proibição aplicada mais precisamente ao que não está autorizado, e distingue-se da auto-censura ou da censura, constantemente invocadas como explicação de todos os silêncios da História".
È óbvio que a muitos é irrelevante que na verdade Moisés (no saber de Gerald Messadié), um dos gigantes da história da humanidade, na verdade fundador de uma religião e líder de um povo, era na verdade egípcio. Explicamos, para os egípcios os filhos pertenciam às suas mães, era delas a ascendência, e muito embora filho de pai hebreu, o líder dos hebreus era filho de Nezmet-Tefnut, egípcia e irmã do faraó Ramsés II. Derrocada a história de cestinhos de junco, foi só aos 15 anos de idade que teve um contato mais estreito com os hebreus.
Grandes heróis não deixam de ser heróis por opções sexuais ou talvez por uma ou outra excentridade. Alexandre, O Grande é um exemplo. Seu gênio militar se impôs sobre o império persa e foi a base da Civilização Helenica. Na arte da guerra recebeu lições do pai, militar experiente que lhe transmitiu conhecimentos de estratégia e lhe deu os dotes de comando. Ainda jovem teve oportunidade de demonstrar seu valor quando, aos 18 anos, no comando de um esquadrão de cavalaria, venceu o batalhão sagrado de Tebas na Batalha de Queronéia em 338 a.C. Depois do assassinato de seu pai em 336 a.C. subiu ao trono da Macedônia e iniciou a expansão territorial do reino. Para a empreitada contou com poderoso e organizado exército, dividido em infantaria, cuja principal arma era a zarissa (lança de grande comprimento) e cavalaria, que constituía a base do ataque. Tão poderoso homem fazia-se acompanhar de jovens imberbes que o serviriam no que a história podia convencionar de "o descanso do guerreiro".
Outro herói foi Ricardo I ,o Ricardo Coração de Leão. Ricardo foi coroado em 3 de setembro de 1189, fato prejudicado por um tumulto e perseguição à comunidade judaica, na Inglaterra, como parte da histeria causada pelas preparações para a Cruzada. O fato é que Ricardo era possuidor de um caráter intrigante, que provocou muito debate entre os historiadores. Na realidade seu interesse na Inglaterra era a possibilidade de ser uma boa fonte de renda. "Ele nunca falou uma palavra de inglês, embora tenha ali nascido, mas era por natureza ligado à França. Mesmo assim, isso não impediu de ser visto como uma das figuras mais heróicas da Inglaterra." explica W.B.Bartlett em seu livro Historia Ilustrada das Cruzadas (Ediouro).
Segundo Jean Plaidy em sua "Saga dos Plantagenetas" (Editora Record), Ricardo foi criado na França entre cavaleiros e trovadores, era heróico e suas campanhas na Sicília, a conquista de Chipre e as vitória na Terra Santa lhe deram a fama. "Porém Ricardo possuía também uma estranha natureza, revelada no conflituoso relacionamento com o rei Felipe da França, no elo místico com o sultão Saladino e na dedicação do menestrel Blondel, que viajou pela Europa até descobrir seu adorado amo na fortaleza de Dürenstein". O leão enfim, tinha seu lado doce que faria parte dessa era de esplendor e de crueldade, mais que isso, foi o caráter aventureiro de Ricardo que levou ao enfraquecimento da instituição monárquica na Inglaterra, abrindo caminho para a crise que seria desencadeada no reinado seguinte.
A realeza sempre nos deu boas histórias e muitas controvérsias, uma das grande polêmicas do século passado foi a morte do Czar Nicolau II e de toda a sua família. Segundo Marc Ferro o assassinato de Nicolau II e da família imperial pelos bolcheviques,em Ekaterimburg, em julho de 1918,é um acontecimento bem identificado, tão conhecido quanto a execução de Luís XVI. No entanto, muitas informações e igualmente muitos indícios levantam um dúvida quanto à realidade do relato sobre esse assassinato - não fosse a sobrevivência da mais jovem das filhas da família imperial, Anastácia, que disseram ser uma impostora". Bela, talvez nem tanto como Ingrid Bergman, Anastásia na verdade foi verdadeiramente reconhecida por Botkine Filho, mas devemos perguntar, quem gostaria de acreditar nele? Ele que havia sido seu colega de brincadeiras em Petrogrado e depois na Sibéria, tendo retornado dos Estados Unidos, fica sabendo que a família, depois de ter reconhecido Anastásia, renega-a para assegurar a passagem da herança de Romanov ao ramo de Cirilo. O dinheiro também é motor da história. Mas tudo poderia ter um ponto final por aqui não fosse a Igreja Católica Ortodoxa Russa ter decidido canonizar Nicolau II, sua esposa e os cinco filhos do casal. A canonização do último Czar da Russia, Nicolau II, juntamente com a esposa Alexandra e os cinco filhos do casal: Aleksey, Olga, Tatiana, Maria e Anastásia. Foi decidida na reunião do Conselho Eclesiástico na presença do Patriarca Alexis na qual os arcebispos decidiram também canonizar outros 853 mártires do século XX, muitos dos quais eram sacerdotes e monges mortos pelos comunistas.

"Talvez ninguém aceite outra versão dos fatos
Que a fantasia é a mordaça da realidade
Os ídolos de barro para os insensatos
E, aos verdadeiros homens, homens de verdade!"

E AGORA A REPÚBLICA


Longe de querermos ter esgotado o assunto República chegamos até a Proclamação em si. Mas a República também tem os seus tabus. Na tentativa de derroca-los algumas obras se apresentam como fundamentais como a que vem agora a público pela Editora Civilização Brasileira . Em "O Brasil Republicano", série coordenada por Jorge Ferreira e Lucilia de Almeida Neves Delgado é dada continuidade ao projeto História Geral da Civilização Brasileira, último grande trabalho organizado por Sérgio Buarque de Hollanda, entre 1960 e 1972. São abordagens plurais e críticas contando com historiadores das principais universidades e instituições brasileiras - convidados, levando-se em conta os critérios de pluralidade, especialidade e reconhecimento acadêmico. São quatro volumes de "O Brasil Republicano" : O tempo do liberalismo excludente, O tempo do nacional-estatismo, O tempo da experiência democrática e O tempo da ditadura.


No primeiro volume de O Brasil Republicano, O tempo do liberalismo excludente, tem início com o conturbado período que se segue à proclamação da República e finaliza com a Revolução de 1930. É quando surgem os padrões culturais, sobretudo a febre modernizante que acompanharam a proclamação da República. Dizendo-se liberal, o novo regime era ao mesmo tempo, excludente. Foi um período onde eclodiram rebeliões lideradas por elites políticas insatisfeitas, tanto civis como militares. O segundo livro fala sobre o tempo do nacional-estatismo, volta-se exclusivamente para a década de 1930 e o apogeu do Estado Novo. O ano de 1930 terminou com uma revolução e com um governo provisório. A partir daí, vários projetos políticos disputaram o poder no país. Os mais atuantes e influentes na época tentaram se impor recorrendo às armas, mas foram derrotados em 1932, 1935 e 1938. Ao final, os insatisfeitos com Getúlio Vargas foram silenciados: o governo constitucional transformou-se na ditadura do Estado Novo. No entanto, o regime autoritário incentivou a industrialização do país, patrocinou uma política cultural que encontrou receptividade entre artistas e intelectuais e elevou os trabalhadores à condição de personagens centrais do regime. Em O tempo da experiência democrática, temos o resgate da prática da democracia no Brasil que se abre com o movimento queremista até o seu colapso com o golpe civil-militar de 1964. O ano de 1945 começou com um movimento inverso: a ditadura do Estado Novo entrava em crise, mas o prestígio do ditador crescia entre os trabalhadores. Com a consolidação da democracia, diversos personagens passaram a se manifestar politicamente: trabalhadores, camponeses, militares, empresários, estudantes, artistas, intelectuais, entre outros. Vivendo uma experiência democrática, a população brasileira, por meio do voto, demonstrava preferências pelo projeto nacional-estatista defendido por trabalhistas e comunistas, mas não tanto pelo programa dos liberais udenistas. Ao final, a direita radicalizou, negando-se a aceitar qualquer tipo de reforma, defendendo seus privilégios a todo custo. Mas a esquerda igualmente polarizou, querendo as reformas a qualquer preço. Por fim O tempo da ditadura, a era dos generais que vai até a eclosão de movimentos sociais no final do século XX. Os militares, ao lado de seus aliados civis, tomaram o poder em março de 1964 e implantaram uma ditadura que durou muito além do previsto até mesmo por eles. Para isso, o regime recorreu à violência, à censura e à espionagem. Muitos melhoraram de vida com o "milagre" econômico e tantos outros se tornaram ainda mais pobres do que eram. Políticos, religiosos, estudantes, artistas e intelectuais se opuseram ao governo dos generais e pequenos grupos de jovens partiram para a luta armada com desejo implantar o socialismo no país. O tempo da guerra suja é melhor entendido em nossa próximo tabu, porém maior tabu hoje em dia é apontar novos "democratas" que estiveram o tempo todo do lado do poder militar.
Outro tabu, e dos mais dolorosos e temidos, era o General Golberi do Couto e Silva. Escrevemos era porque, a partir de exaustiva pesquisa documental, Elio Gaspari conta como dois generais aos poucos desmontaram a ditadura que haviam ajudado a construir: Ernesto Geisel, o Sacerdote, e Golbery do Couto e Silva, o Feiticeiro, atuaram juntos no comando do regime militar brasileiro e o conduziram à derrocada. O relato que inaugura a trilogia O Sacerdote e o Feiticeiro (Cia das Letras) vai de junho de 1971, quando um bilhete anunciava que o novo presidente seria "o Alemão", à avassaladora vitória da oposição nas eleições parlamentares de 1974.


Sobre o livro Marcos Sá Corrêa escreve - "A mistura de pesquisa exaustiva com inconfidências inimagináveis dá às páginas d'A ditadura derrotada o atestado definitivo de que a história supera, sim, a ficção. Em vez de personagens reais dizendo coisas imaginárias, elas têm personagens reais dizendo coisas inimagináveis. Geisel se deixou gravar por um auxiliar de confiança num governo que censurou o presente e o passado mas deixou ao futuro o legado de suas próprias entranhas abertas à exposição pública."


E outras histórias vão saindo das sombras. A de Chico Mendes é outra delas. O jornalista Zuenir Ventura escreveu "Chico Mendes - Crime e Castigo" (Cia das Letras). Quinto volume da série Jornalismo Investigativo teve segundo o autor a preocupação de não tratar Chico como um mito. Em entrevista por ocasião do lançamento do livro, chegou a declarar que ele foi um mártir da causa ambiental mas "não gosto de achar que temos que mitifica-lo. No livro, revelo que ele foi bígamo.Não se tem de esconder isso para fazer dele um personagem religioso.(...)Tive a preocupação de trata-lo não como mito, mas como um líder como poucos que o Brasil produziu."

MONARCAS


Mais tarde temos as histórias de nossos monarcas. É sabido que Carlota Joaquina não era nenhuma flor de pessoa e a esta, poucas vezes os historiadores deram desconto. Personalidade forte, temperamento difícil, teve muitos inimigos e outros tantos bajuladores era considerada um estorvo na vida de D. João VI. Para Oliveira Lima sua alma "poderia chamar-se masculina, não tanto pelo desejo imoderado de poder e pelo cinismo, quanto pela sua pertinácia em alcançar seus fins e pela dureza..." Frente a tal quadro Francisca L. Nogueira de Azevedo em seu livro "Carlota Joaquina, na corte do Brasil" (Civilização Brasileira) "estilhaçar o bloco monolítico que forma essa imagem pública", imagem essa que segundo o historiador português Luís Torgal "...as análises disponíveis sobre esta personagem da história portuguesa apenas transmitem uma lenda negra e anedótica". Estaria na hora de rever esse capítulo histórico.
Quanto a Dom Pedro I, parecemos ser um pouco mais condescendentes, dando-nos possibilidades de escrevermos livros intitulados, por exemplo, "As maluquices do Imperador", de Paulo Setúbal. Vez por outra surgem alterações como quando do lançamento de "Chalaça" de José Roberto Torero. Duílio Crispim Farina, mesmo respeitoso produziu um outro livro diremos, incômodo. Mesmo respeitoso e ganhador do prêmio José Almeida Camargo (1975) da Associação Paulista de Medicina, o livro tratava de um tema dito íntimo, e discorria o livro sobre o "Tempo de Vida, Doença e Morte na Casa de Bragança (Ramo do Brasil)", enfim sobre os achaques, a epilepsia do primeiro imperador e as convulsões do segundo. Sequer a citação de Joaquim Nabuco na página de rosto ajudava dissimular a intromissão - "a missão da monarquia no Brasil não tem exemplo na história das dinastias. O primeiro Imperador criou a nacionalidade, o segundo constituiu a nação e sua filha, numa curta regência, aproveitando o que ela mesma havia iniciado, realizou a abolição, fundando a igualdade social.
Mas Pedro II foi sua própria vitima na história. Provocava escândalos que geravam artigos, peças, romances e muitas charges. A sua má fama contrapunha-se à sua ousadia em busca das modernidades e da cultura. Sergio Gomes de Paula escreve que os enredos de suas histórias faziam as delícias dos oposicionistas e trouxeram grande mal-estar aos monarquistas. "até aí, nada de novo; mas, para agravar, falaram-se coisas mais do que malévolas sobre a vida privada de D. Pedro II, contaram-se casos que faziam dele um furioso da libido". As garotas de pouca idade faziam pano de fundo e a nitroglicerina para seus opositores. A questão do simulado roubo das jóias da coroa foi explorado por muitos como Raul Pompéia, Artur Azevedo e José do Patrocínio. Raul Pompéia escreveu "As Jóias da Coroa" e, recentemente, charges, desenhos satíricos de Agostini, Belmiro de Almeida e Asmodeu foram reunidos aos textos dos três no livro "Um Monarca da Fuzarca" (Relume-Dumará).
Pelo sim, pelo não D. Pedro II, em 16 de novembro de 1889, quando soube que o marechal Deodoro da Fonseca era o chefe do novo regime exclamou - "estão todos malucos!".